A franquia Rocky Balboa fez seu nome e sua fama com a saga do lutador underdog, uma expressão sem muito equivalente em português que quer dizer aquele que veio de baixo e em quem ninguém acredita muito. Seria quase o vira-lata. Então, como torcer para um menino que, apesar do início da vida em internatos, vem a morar em uma mansão com a esposa de Apolo Creed, de quem ele é filho fora do casamento? De alguma forma, funciona, com uma releitura do conceito original, o que é fundamental para entender o sucesso de Creed I e agora II.
Se em Creed, Adonis é aquele lutador que surge do nada, agora ele é concorrente ao título de peso pesado, contra um velho conhecido. É a estrada para o sucesso, que já foi vista antes nos filmes do boxeador vivido por Stallone, que continua na posição secundária de treinador, agora avô, e que tem o personagem tratado com respeito, carinho e adoração. Tessa Thompson ganha mais destaque como companheira de Adonis Creed, que tem todas as luzes e o palco para ela, tanto que, em determinado, momento Stalone diz que agora é o seu momento, uma emocionante cena muito bem produzida, naquela que deve ser a despedida do icônico personagem. Isso tudo até que surja um velho conhecido dos fãs, Ivan Drago, que traz seu filho para um novo Creed versus Drago, com toda a carga dramática que isso acarreta.
O diretor Steven Caple soube acomodar dois conceitos difíceis: como lidar com um legado enorme e ainda assim fazer história? Não por acaso o mesmo desafio de Adonis Creed, vivido com garra e coração pelo jovem, cada vez menos promessa e cada dia mais realidade, Michael B. Jordan, que desponta como um novo Denzel Washington, e enche a tela com sua intensidade, apoiado por uma trilha poderosa e atual, que no momento entrega exatamente aquilo que todos esperam.
Para o público, a jornada não é fácil. Ver o jovem Adonis sofrer, seja no ringue ou fora dele, é dolorido. A conexão é grande, e a sombra lançada pela trágica morte do pai se estende por todo o filme. Afinal, não é um filme sobre boxe, é um filme sobre a luta interna de cada um, sobre motivação, fibra, perdas e ganhos, muitas vezes simultâneos: para ganhar é necessário perder algo. Ao desconstruir heróis e vilões e se aprofundar em suas escolhas, suas dores e suas buscas, o filme consegue ir além e entregar algo a mais que a franquia Rocky, sendo um misto entre releitura dos melhores momentos e novidade, tudo na dose certa.
Valendo cada minuto de tela, Creed II passeia com segurança pela franquia Rocky, sabendo quando acelerar ao ritmo moderno e quando dar um tempo como a sequencia original sabia fazer, fazendo um jogo de quadril e desviando de quem acha que está indo assistir a um remake de Rocky 4, flertando com Rocky 3 e conseguindo tocar até mesmo o esquecível Rocky 5, com uma poderosa mensagem sobre família e sobre o que tem valor na vida, como um potente gancho de direita que poderia ter sido desferido por Apollo, por Rocky ou mesmo pela dinastia Drago, mas que é dado pelo novo campeão da franquia, Adoooooooooooooonis Creed, para adoração da audiência, que não consegue assistir passivamente e se entrega em um final imprevisivelmente emocionante, com socos, gritos e aplausos. Longa vida a Creed.