Divino, Dois Papas é exemplo de como se contar uma história

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O mundo assistiu chocado a renúncia do papa Bento XVI em 2013, um fato que não ocorria há séculos, e logo em seguida assistiu aliviado quando um cardeal argentino se tornou o papa Francisco, tão diferente de seu antecessor. Certamente uma história que merecia ser contada, e coube a Fernando Meirelles a tarefa de fazer isso, de modo magistral.

Dois Papas conta o que ocorreu nas duas eleições papais, e se baseia em fatos e uma boa dose de dramatização para tentar jogar luz sobre o movimento mais misterioso da Igreja Católica em muito tempo.  Com o foco alternado entre os dois papas, a narrativa se vale de partir dos lugares comuns da opinião pública sobre essas figuras para tentar destrinchar as pessoas por baixo da batina.

Difícil falar o que está melhor no filme. A direção magistral de Fernando Meirelles, com o roteiro perfeito de Anthony McCarten contam uma história difícil de forma leve e profunda ao mesmo tempo, criando momentos impagáveis para contrastar com diálogos que mais parecem uma partida de xadrez entre o lado conservador e o lado progressista da Igreja. Ainda que os momentos mais decisivos sejam explicitados na tela, existe a sensibilidade de não se apertar pontos nevrálgicos e provocar desnecessariamente, inclusive abafando alguns diálogos mais tensos, mostrando um bom senso narrativo de expor sem explorar, conseguindo evitar a covardia e a provocação gratuita. Ainda que temas difíceis pareçam ser a especialidade da dupla, o arco narrativo e a direção conseguem subverter expectativas mostrando “os podres” de Francisco e evitando crucificar Bento.

A maior força do longa reside na exuberante atuação conjunta de Anthony Hopkins como Bento, e de Jonathan Pryce como Francisco. Fisicamente parecidos com seus personagens, os dois atores entregam uma atuação perfeita, à prova de críticas, de maneira complementar, como se atuassem juntos há muito tempo. Ainda que se esperem grandes atuações de Hopkins como o grande ator que é, fazia tempo que não havia uma performance tão magnífica dele, na qual Pryce, mais conhecido como O Grande Pardal de Game of Thrones, não deixa por menos e consegue personificar a figura amada e humilde de Francisco, dando profundidade ao mesmo.

Extasiante e emocionante, Dois Papas é uma aula de cinema, e suas indicações aos prêmios são mais do que justificadas, se transformando na grande surpresa do cinema em 2019. Foi exata nos acontecimentos e tomou muitas liberdades poéticas, fato é que o filme consegue lançar uma luz sobre a renúncia de Bento, e mostrar um lado mais humano do mesmo, conduzindo o público por uma história cativante e única. Bravo.