Terceira tempora de Demolidor eleva as séries de herói ao seu patamar mais alto

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Esqueça tudo o que você já viu sobre filmes e seriados de heróis. Deixe de lado as máscaras, roupas coloridas, poderes vistosos. Agora volte atrás nas histórias mais antigas e mitológicas, na jornada do herói e nos modelos de personalidade e você terá a essência das melhores histórias contadas. Essa é a terceira temporada de Demolidor.

Passada logo após o término de Defensores, quando literalmente o prédio cai em sua cabeça, a jornada de Matt Murdock se reinicia em sua origem: no orfanato onde cresceu, para onde foi levado para se curar de suas feridas, profundas e marcantes, tanto físicas como psicológicas. Essa é a Queda de Murdock, brilhante adaptação para as telas da obra premiada de Frank Miller e David Mazzuchello na década de 80. Com o retorno triunfal de Wilson Fisk, com Vincent D´Onoffrio melhor que nunca, Matt Murdock vê toda sua obra como Demolidor ameaçada, e suas relações privadas e heroicas desmoronando tal qual o Midland Circle. 

Os grandes momentos dos heróis dos quadrinhos nas telas se deram quando eles foram contextualizados em um mundo maior que eles, e sua humanidade explorada acima de seus poderes e habilidades. Isso aconteceu com Capitão América: Soldado Invernal, verdadeiro filme de espionagem; em Pantera Negra e Guerra Civil que trouxeram a dúvida da existência e do legado humano ao coração dos personagens, e no épico Logan, epíteto e ponto maior da trajetória de Wolverine nos cinemas. Verdade que a Netflix, ao explorar os heróis tidos como “urbanos”, tinha uma missão muito mais fácil do que humanizar o Thor, por exemplo, mas o desafio estava em fazer isso e ainda manter a essência interessante a uma geração cada vez mais demandante de expectadores. E nenhuma obra chegou aos pés dessa terceira temporada de Demolidor. 

Tensa, sombria e caótica, esse terceiro ano do Homem sem Medo conseguiu manter aquela ação espetacular de lutas “feias e reais” excelente, cuidando da origem de um grande e icônico vilão, ao mesmo tempo que explorava paralelamente o arco de busca e redenção de Matt, e porque não, de seus inseparáveis amigos Nelson e Karen, maravilhosos em seus papéis, como aliás todos os atores, conhecidos e desconhecidos, protagonistas, antagonistas e coadjuvantes que se revezavam sob os holofotes, sob os olhares atentos e respirações ofegantes dos telespectadores.  

A arquitetura gótica de Nova Iorque se mostra o perfeito palco, com uma majestosa iluminação, para os dramas mais humanos, sem pieguice nem obviedades, mostrando a doce sedução da perdição a cada esquina, e a fagulha da redenção e do sucesso se afastando com o passar dos episódios, obras a serem apreciadas em cada detalhe, em diálogos, frases, olhares e ações como uma ópera bem ensaiada.  

Em interessante movimento introspectivo de retração de um universo recém expandido, Demolidor precisava se bastar em sí mesmo, oferecendo ao seguidor mais fiel a terrível sombra do destino dos quadrinhos, e aos fãs televisivos a gravidade daquela que é a história da queda (e redenção) que define Matt Murdock enquanto homem e Demolidor enquanto herói. Missão cumprida com louvor.